sexta-feira, maio 11, 2012

Bernardo


Bernardo da Costa Sassetti Pais


Soube hoje pelas redes sociais, coisa a que nunca acedo, que tinhas partido. Fiquei parado e parvo, afetado e profundamente triste. Depois, pouco a pouco, lembrei-me dos anos que passamos juntos na vida um do outro, é como se tivesse sido ontem. Nos últimos tempos encontrávamo-nos menos, mas quando nos víamos era como se tivéssemos estado juntos no dia anterior.

Lembro-me de nós no Liceu, de sapatos (tennis só em dias de ginástica), pullover de decote redondo azul escuro e polo com golas fora do pullover. De ti de cachecol de xadrez escocês, que usavas até ao pingo do verão. Das tuas graças e das tuas frases feitas sempre com graça “é muito boa atriz e muito boa atrás”. Das tuas mãos grandes, tinhas umas mãos enormes!

Divertíamo-nos e riamos de manhã à noite, lembras-te? Gozávamos uns com outros, com as nossas manias, com as professoras, lembras-te? Adorava implicar contigo porque descendias do marquês de Pombal e eu dizia que não falava a gente com sangue daquele canalha.

Trabalhavas imenso (ao piano) e eu lia sentado naquela vossa sala com pianos. O vosso pai fazia-nos chá naqueles bules castanhos ingleses e era sempre um ritual muito explicado e demorado. Lembras-te que a certa altura o teu mano Francisco tocava piano para uma cantora lírica e nós íamos espreita-los ao longo daquela varanda que percorria a casa: A vista mais bonita de Lisboa. Ajudava-te a organizar as tuas fichas de cinema. Eu fazia fichas de leitura e tu fazias fichas de filmes, ainda as tens? Lembro-me da tua casa como se tivesse lá ido hoje almoçar como fazia tantas vezes.

Devo-te todos os filmes clássicos que vimos na cinemateca à tarde, as primeiras idas ao hotclub … nunca lá mais voltei, só há uns anos com a minha ana e um amigo, e depois ardeu. Devo-te todos os palavrões que tu e o Zé me obrigavam a dizer, porque eu não dizia palavrões. Usavas adjectivos que nós não usavamos como "fabulosa" ou "formidavel" aplicadas claro à Grace Kelly, a Audrey, à Ingrid Bergman...

Em casa podíamos chamar-te Bábá mas no Liceu tinha de ser sempre Bernardo, porque os colegas gozavam. Entramos juntos no MCE (movimento católico de estudantes) com o Pe. Zé Manel, lembras-te? Depois saíste e eu acabei por sair também. Lembro-me dos teus tempos em Grenoble e das cartas que escrevíamos (sou capaz de ainda as ter) tenho é muitos papelinhos daqueles que trocávamos nas aulas entre nós, tu, o pedro e o zé e com as miúdas, a mitchi, a conceição, lembras-te? Tu eras um blazé e apuras-te isso!

Só cheguei a conhecer a tua pequenina mais velha, no chiado lembras-te? fomos à Benard.

A minha fé diz-me que ainda te vou encontrar, um dia, com todos os outros que marcaram a minha vida para sempre e estão lá, em cima, no céu. E a experiencia, diz-me que nada do que se Vive com alguém morre, fica, vive sempre.

Um abraço, até um dia destes miúdo,